Mudanças no Imposto de Renda: o que o governo pretende com a reforma
A reforma tributária ideal esperada pelo governo de Jair Bolsonaro (PSL) inclui, entre seus pilares, mudanças no Imposto de Renda (IR). Ainda não há uma proposta detalhada, até porque o governo pode “desistir de um projeto próprio” e abraçar uma das PECs em tramitação no Congresso. Contudo, a equipe econômica já sinalizou: as alterações devem incluir o fim (ou a imposição de um limite) nas deduções de despesas médicas para pessoas físicas; a correção da tabela do IR pela inflação; a redução na alíquota; e mudanças para as empresas, como o fim da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
Especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, entretanto, afirmam que as alterações precisam ser analisadas exaustivamente pelo governo. Isso porque a União não pode abrir mão de parte da arrecadação – tanto por motivos financeiros quanto por restrições na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
“Não dá para acreditar que, imediatamente, uma mudança na tributação resulte em um aumento de arrecadação. A economia é complexa e dinâmica. No médio e longo prazo, é possível ter cálculos com menos risco de erro mas, a curto prazo, a chance de errar é bem maior por causa da dinâmica da economia”, alerta Gilberto Luiz do Amaral, presidente do conselho superior do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT).
Diminui de um lado, aumenta de outro
Não há dúvidas, entretanto, de que o IR precisa passar por reformas. Estabelecido ainda durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), nos anos 1990, o modelo atual é considerado regressivo por especialistas – ou seja, uma forma de tributação que penaliza os mais pobres.
“A proposta do governo não é de todo ruim, mas não ataca o principal problema, que é a regressividade do sistema. É isso que torna o Brasil um dos países mais desiguais do mundo”, afirma Paulo Henrique Pêgas, professor do Ibmec no Rio de Janeiro.
Para ele, um dos principais pontos que precisam ser alterados é a ausência de tributação de dividendos, que está no modelo atual. O governo afirma que estuda implantar esse tipo de tributação, em uma compensação ao fim da CSLL.
“Se simplesmente houver o fim da CSLL, o que vai acarretar em uma redução na tributação das empresas, necessariamente terá que haver um aumento de arrecadação no imposto da pessoa física. Se alivia de um lado, aumenta do outro”, explica o presidente do conselho superior do IBPT.
Mais um ponto a ser considerado pelo governo, nesse caso, diz respeito à distribuição dos recursos. Hoje, por lei, o dinheiro do Imposto de Renda é repartido entre União, estados e municípios – mas a CSLL fica de fora. Se o governo incorporar essa arrecadação no IR, terá que repassar parte do dinheiro para os demais entes federativos.
Dedução de gastos com saúde
Se, no geral, a proposta do governo – ou a que será “abraçada” pelo governo – não mira a desigualdade do IR, um dos pontos fica fora dessa regra. São as mudanças nas deduções com despesas médicas, que seriam extintas ou passariam a ter um limite. Segundo estudo da Secretaria de Avaliação de Políticas Públicas, Energia e Loteria (Secap) do Ministério da Economia, apenas os 20% mais ricos da população estão apresentando esse tipo de despesa em suas declarações anuais.
Em 2017, ainda de acordo com os dados, o governo federal deixou de receber R$ 15,1 bilhões por conta das deduções. Desde 2010, o crescimento no valor abatido foi de 40%.
“Isso vai aumentar a arrecadação, porque as classes média e média alta serão atingidas. Mas, no conjunto, esses setores não são os que vêm sendo mais beneficiados”, critica Pêgas.
Custo da isenção
O aumento da faixa de isenção, por sua vez, também pode ter impactos para os demais contribuintes. Isso porque, para compensar a perda de arrecadação, o governo precisaria aumentar a alíquota nas demais faixas.
“Essa é uma equação difícil de resolver. Se houver a isenção dos ganhos de até cinco salários mínimos e a correção anual da tabela, melhora a situação de uma faixa. Mas, em contrapartida, também aumenta a tributação dos que ganham mais do que isso”, diz Gilberto Amaral.
Ele pondera, por fim, que as reformas no IR precisam ser pensadas em conjunto com as demais mudanças no sistema tributário – o que não tem sido feito, por exemplo, nas propostas que já tramitam no Congresso. “Não dá para ficar fazendo ajustes. É preciso fazer uma reforma profunda, não algo em pedaços”, conclui.