Exclusão do ICMS ST da base de cálculo do simples nacional

Recentemente o STF decidiu, com efeitos retroativos a partir de 15 de março de 2017, que o ICMS não compõe a base de cálculo do PIS e da COFINS, ou seja, o ICMS que incidiu sobre toda a cadeia de tributação deve ser expurgado da base de cálculo daquelas contribuições por se tratar de um valor que não é receita do contribuinte, mas sim, receita dos estados.

Um dos pontos mais controversos desse julgamento se deu em torno do valor de ICMS que deveria ser excluído: O destacado na nota fiscal de saída ou o “a pagar” devido pelo contribuinte. Por fim, o STF fixou a tese de que o ICMS a ser excluído da base de cálculo do PIS e da COFINS é o valor destacado na nota fiscal de saída.

Da leitura do parágrafo anterior, fica evidente que o STF tratou especificamente do ICMS em sua operação normal, a sistemática do Débito e Crédito, já que é dito: “o valor destacado na nota fiscal de saída”. E quanto àquela gigantesca parcela das operações sujeitas à Substituição Tributária?

Em relação aos contribuintes substitutos, não há nenhuma dúvida sobre os seus procedimentos. O ICMS ST por eles recolhido e destacado em nota fiscal sempre pôde ser excluído da base de cálculo. Agora basta excluir também o ICMS Próprio. A polêmica diz respeito às operações dos contribuintes substituídos.

Primeiramente é importante entender o conceito da Substituição Tributária:

  • 7º, art.150 da CF/88 – “A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido.
  • 5º, Art. 8º da LC 87/1996 (Lei Kandir) – “O imposto a ser pago por substituição tributária, na hipótese do inciso II do caput, corresponderá à diferença entre o valor resultante da aplicação da alíquota prevista para as operações ou prestações internas do Estado de destino sobre a respectiva base de cálculo e o valor do imposto devido pela operação ou prestação própria do substituto.”

Embora seja recolhido pelo substituto tributário antecipadamente e o seu preço esteja “embutido” na nota fiscal de aquisição, o ICMS ST não deve ser reconhecido como custo. Ele continua sendo imposto devido pelo substituído ao revender a mercadoria, é neste momento que o fato presumido se torna fato gerador definitivo.

Exemplo Contábil

A tabela abaixo consiste em duas simulações de apuração do ICMS. A primeira é pelo método da Substituição Tributária e a segunda pelo Regime Normal (Débito e Crédito). Premissa: O percentual da MVA da mercadoria corresponde ao preço efetivamente praticado pelo Varejista quando da sua saída.

         A   B = A x 18%           C     D = A x C   E = D x 18%     F = E – B
Regime de Tributação Valor da Mercadoria (Indústria) ICMS Próprio (Industria) 18% MVA (Formação do Preço de Venda Antecipado)     BASE       CÁLCULO     ICMS ST    ICMS   TOTAL  DA     CADEIA   ICMS ST      (Icms do     Varejista)
Substituição Tributária         1.000,00            180,00          35%         1.350,00            243,00              63,00

 

              A    B = A x 18%         C           D    E = D x 18%       F = E – B
Regime de Tributação Valor da Mercadoria (Indústria) ICMS Próprio (Industria) 18% Mark UP – Formação do preço de venda do varejista NF-e de Venda do Varejista ICMS destacado na NF-e de Venda do Varejista ICMS a Recolher do Varejista
Débito e Crédito         1.000,00            180,00         1.350,00            243,00              63,00

 

Veja que TODOS os elementos que compõem a apuração do ICMS pela sistemática “Débito e Crédito” estão presentes na apuração através da Substituição Tributária. NÃO HÁ DIFERENÇA, sob os pontos de vista contábil, tributário e econômico, entre os dois métodos. A sistemática diferenciada de recolhimento, por antecipação, não altera a essência do imposto. O substituído continua sendo contribuinte do imposto: Contribuinte de fato.

Diante dessa evidência, alguns tribunais já têm ampliado a tese do STF para as operações sujeitas à substituição tributária:

Tribunal Regional Federal da 3ª Região TRF-3 – APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA

“Restou consignado ainda que, inobstante ao precedente mencionado não ter feito referência alguma a respeito do ICMS recolhido em regime de substituição tributária (ICMS-ST), há que se concluir igualmente a respeito de tal possibilidade, especialmente em observância da isonomia entre os contribuintes sujeitos à substituição tributária e outros responsáveis pelo pagamento tão somente de seu próprio ICMS, bem como que o ICMS-ST não constitui tributo diverso do ICMS próprio, mas apenas uma técnica de arrecadação que concentra no industrial ou no importador (a depender da relação jurídica envolvida) o ônus da retenção e pagamento antecipado da exação estadual, conforme jurisprudência do STJ.: ApelRemNec 5000372-64.2017.4.03.6104 SP.

Caso a exclusão do ICMS ST seja de fato aceita pelos tribunais, isso abrirá precedente para uma interessante e ousada tese: A exclusão do ICMS ST na base de cálculo dos tributos abrangidos pelo Simples Nacional.

Como é de conhecimento geral, os contribuintes optantes pelo Simples Nacional não estão dispensados do ICMS ST, tanto na condição de substitutos, quanto na condição de substituídos. É o que determina a Lei Complementar 123:

Art. 13.  O Simples Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único de arrecadação, dos seguintes impostos e contribuições:

  • 1oO recolhimento na forma deste artigo não exclui a incidência dos seguintes impostos ou contribuições, devidos na qualidade de contribuinte ou responsável, em relação aos quais será observada a legislação aplicável às demais pessoas jurídicas:

XIII – ICMS devido:

  1. nas operações sujeitas ao regime de substituição tributária.

Tendo isso em vista, é possível concluir que os contribuintes optantes pelo Simples Nacional, assim como os contribuintes do demais regimes, adquirem produtos e mercadorias para revenda com o valor do ICMS ST embutido no preço.

Outro fato importante diz respeito à base de cálculo dos tributos abrangidos pelo Simples Nacional:

Lei Complementar Nº 123 de 2006

“Art. 18. O valor devido mensalmente pela microempresa ou empresa de pequeno porte optante pelo Simples Nacional será determinado mediante aplicação das alíquotas efetivas, calculadas a partir das alíquotas nominais constantes das tabelas dos Anexos I a V desta Lei Complementar, sobre a base de cálculo de que trata o § 3º deste artigo, observado o disposto no § 15 do art. 3º.”

“§3º Sobre a receita bruta auferida no mês incidirá a alíquota efetiva determinada na formado caput e dos §§ 1o, 1o-A e 2o deste artigo, podendo tal incidência se dar, à opção do contribuinte, na forma regulamentada pelo Comitê Gestor, sobre a receita recebida no mês, sendo essa opção irretratável para todo o ano-calendário.”

“Art. 3. Para os efeitos desta Lei Complementar…

  • 1º Considera-se receita bruta, para fins do disposto no caput deste artigo, o produto da venda de bens e serviços nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado nas operações em conta alheia, não incluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos.”

Veja agora o conceito de Receita Bruta da Lei Nº 10.833 de 2003 que trata da cobrança não-cumulativa da COFINS:

Art. 1o A Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS, com a incidência não cumulativa, incide sobre o total das receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil.”

“§ 1o Para efeito do disposto neste artigo, o total das receitas compreende a receita bruta de que trata o art.12 do Decreto Lei Nº 1.598 de 1977.”

Art. 12.  A receita bruta compreende: 

I – o produto da venda de bens nas operações de conta própria; 

II – o preço da prestação de serviços em geral; 

III – o resultado auferido nas operações de conta alheia; e

IV – as receitas da atividade ou objeto principal da pessoa jurídica não compreendidas nos incisos I a III.”

Agora compare ambos os dispositivos:

                                                    RECEITA BRUTA
    Lei Complementar Nº 123 de 2006       Lei Nº 10.833 de 2003 (COFINS)
O produto de venda de bens e serviços nas operações de conta própria; O produto da venda de bens nas operações de conta própria;
O preço dos serviços prestados; O preço da prestação de serviços em geral;
O resultado nas operações em conta alheia. O resultado auferido nas operações de conta alheia.

Resta evidente a identidade entre as bases de cálculo entre os regimes. Contudo, é importante lembra que no Simples Nacional a gama de tributos incidentes sobre a Receita Bruta é ainda maior.

“Art. 4º A opção pelo Simples Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único de arrecadação, no montante apurado na forma prevista nesta Resolução, em substituição aos valores devidos segundo a legislação específica de cada tributo, dos seguintes impostos e contribuições:

I – Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) ;

II – Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI);

III – Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) ;

IV – Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS) ;

V – Contribuição para o PIS/Pasep;

VI – Contribuição Patronal Previdenciária (CPP) para a Seguridade Social, a cargo da pessoa jurídica, de que trata o art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991;

VII – Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) ;

VIII – Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS).”

Diante de todo o exposto, em obediência ao princípio da isonomia tributária que dispõe a Constituição Federal, é completamente pertinente que os contribuintes optantes pelo Simples Nacional excluam de sua base de cálculo o valor recolhido a título de ICMS ST.  

É, sim, verdade que o art. 24 da Lei Complementar 123/2006 determina que é incompatível com este regime especial de tributação qualquer incentivo ou benefício fiscal, o que em tese justificaria o fato de até agora estes contribuintes terem sido ignorados no debate sobre a exclusão do imposto. Contudo, a exclusão do ICMS ST não se trata de um incentivo, mas apenas de uma “redefinição” do conceito de Receita Bruta para fins de apuração de tributos.